domingo, 9 de abril de 2006

Da não-lírica das desilusões do cotidiano

Às vezes eu acho que deveria haver um modo de seleção natural inteligente que só permitisse que pessoas decentes caminhassem sobre a Terra. Mas o mundo está todo invertido.

O que é público virou privado (veja as pessoas depredando os ônibus e escolas como se fossem algo de propriedade delas) e o privado vira público (nem é preciso comentar, dada a enorme fascinação que lixo cultural como Big Brother exerce sobre as pessoas).

O que um dia foi considerado "feio" (roubar, matar, enganar, extorquir, mentir...) é hoje alardeado como "sucesso". Se você se importa com os outros, ajuda sem esperar nada em troca, se recusa a puxar tapete dos outros para se dar bem, você é o panaca, o idiota, o bundão.

O que é supérfluo virou essencial (mais de 60% dos nomes sujos na praça estão lá por causa de roupas de grife, tênis e eletrônicos) e o essencial virou supérfluo (nego não tem casa para morar, não dá educação para os filhos, não tem nem o que comer direito. Mas tem televisão de 29 polegadas, parcelada em 85 vezes COM juros nos Bancos Bahia).

Hoje eu assisti "V de Vingança" no cinema. Eu já tinha lido o HQ do A. Moore e me lembro que, na época, eu achava aquilo o máximo. O próprio Moore meteu o pau no filme. Não sei se os argumentos dele são válidos, pois a adaptação foi feita para outro tipo de mídia, outro tipo de audiência. Não dá para colocar o policial viajando de LSD, por exemplo. O filme é bem mais politicamente correto que o HQ. Do ponto de vista dramático é um filme muito legal, MAS eu acho que não cabe nesse mundo virado de ponta cabeça. Ficou uma coisa esquisita de pretensa hollywood dentro de uma temática que não cabe em Hollywood. Acho interessante que se queira levar a revolução cultural para a massa, mas não deixa também de ser um ato quixotesco. É jogar pérola aos porcos. Ao sair da sala de cinema ouvi o seguinte comentário: "Que lixo. A gente nem sabe a cara do personagem principal, a história dele!"

Não. Não dá. Nem com as frases óbvias como "Idéias são à prova de balas", as pessoas não entenderam o filme. Se eu fosse o diretor, eu faria um final mais catastrófico.

Se houvesse um um modo de seleção natural inteligente que só permitisse que pessoas decentes caminhassem sobre a Terra, a estatística já nos mostrou que era mais fácil destruir todo mundo.

Pobre do Moore que achou que matando o governo e as formas de repressão as ovelhas se levantariam e virariam gente. Não. Tudo isso foi mal entendido. O governo não é o legislativo, o executivo ou o judiciário. O "governo" está infiltrado em cada um de nós. Em cada esfera social, por menor que seja, estão reproduzidos esses valores podres de corrupção, de mentira, de trapaças. Se fosse fácil assim, já tínhamos dado uma meia dúzia de tiros para consertar o Brasil e mais meia dúzia para consertar o mundo.

Morwen andava pelo deserto quando encontrou uma lâmpada mágica. Ela esfregou a lâmpada e um gênio apareceu. Ele lhe concedeu um desejo. Seu desejo foi: "Quero que o mundo seja um lugar melhor". E o gênio fez sumir todas as pessoas.

***

PS. Sim, estou puta da vida. Daqui a um mês melhora. Certeza.

quinta-feira, 6 de abril de 2006

Sobre a não-lírica das coincidências

Qualquer semelhança é mera coincidência. Compare:

* Aos 5 anos de idade:
- Sorvete?
- Eu! Eu! Eu! Primeiro eu! Tudo eu!
- Tem dinheiro ainda da semanada?
- Aaaaaaaaahhh MANHEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE (esperneia, se joga no chão e finge choro)
- Ô, meu filhinho... Mamãe compra pra você...

* Alguns anos mais tarde:
- Salário alto?
- Eu! Eu! Eu! Primeiro eu! Tudo eu!
- Vai ter que trabalhar.
- Ah... Mas... você fica tão sexy nessa camisa! Ah! Você é gay? Desculpe, eu não estava passando cantada... mas... você gosta da Madonna? e do Brad Pitt? Jura?? Nossa! Você é meu melhooooor amigo! Tão sexy... ai, desculpe... é o hábito, sabe?

* Aos 5 anos de idade:
- Vamos no escorregador?
- Eu! Eu! Eu! Primeiro eu! Tudo eu!
- Sem empurrar seu primo!
- Ahhhh MANHEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE (esperneia, se joga no chão e finge choro)
- Ô, meu filhinho... Vai primeiro... Primo mau...

* Alguns anos mais tarde:
- Preciso mudar de faixa para pegar a saída lá na frente.
- NÃO!!!! Eu! Eu! Eu! Primeiro eu! Tudo eu! (bi bi biiiiiiiii de moto)
- Dá tempo. O motoqueiro espera.
- BI BI BIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII BIIIIIIIIIIIIIIII BIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII BIIIII! (chuta seu retrovisor)



E depois falam que umas belas chineladas vai "contra os direitos humanos".

E o MEU direito? Por que sou obrigada a conviver com esses trastes?! "Homo sapiens sapiens" é o termo mais hipócrita e burro que já vi na vida.

Um apelo, do fundo do coração: se você acha que consumir é tudo, seu único valor é o dinheiro e a aparência, que puxar o tapete dos outros é melhor do que crescer (porque isso dá trabalho), que o legal é ser malandro, se dar bem, nem que isso implique dar a bunda para o diretor e fazer chantagem depois, e acha o má-xi-mo as intriguinhas e jogos de trapaças do Big Brother, por favor, pelo futuro geral do universo, CASTREM-SE. Metam à vontade, mas CASTREM-SE.

E depois falo que os outros são quixotescos. Eu e a minha merda de mania de achar que o mundo tem esperança...

Morwen [em modo MOTOSSERRA]